1 de mai. de 2008

Falta de educação gera caos no trânsito

Essa reportagem demonstra bem a falta de educação do motorista de Fortaleza.

O POVO(27/08/2007) - Mariana Toniatti
da Redação

É fácil flagar infrações de trânsito em Fortaleza. Cruzamento fechado, gente pisando no acelerador e passando no sinal vermelho, causando risco de acidentes. O POVO inicia hoje uma série sobre trânsito.
Quarta-feira, quase 19h30min. Um caminhão atravessado na avenida Desembargador Moreira interrompe a pista que segue em direção ao sertão. O trânsito, que até então fluía sem problemas, pára. O motorista quer dar a ré na rua Visconde de Mauá, mas uma fila de carros já se formou atrás dele. Um Gol estacionado em local proibido, encostado na esquina, diminui o espaço da manobra. Mariano Silva, 55, motorista profissional há 20 anos, não consegue completar a curva. Ele não fez nada de errado, mas tem que agüentar as buzinas e os xingamentos. "Sai daí, seu burro!", gritam do ônibus.
Em alguma sala de aula da Faculdade Integrada de Fortaleza (FIC), o verdadeiro infrator nem desconfia da confusão que armou. O flanelinha confirma, o carro é de um estudante, mas ele, o vigia, "não tem nada a ver com aquilo". Os ajudantes de Mariano o culpam por permitir que parem o carro ali. A história dura menos de dez minutos, suficientes para congestionar três quarteirões. Finalmente, Mariano se livra do constrangimento e segue. O trânsito de Fortaleza sofre com a má educação dos motoristas. As infrações pioram os congestionamentos nos horários de pico e colocam à prova até quem tem a paciência de Jó.
Um cruzamento fechado pode invalidar o tempo de um semáforo verde. Um carro parado na pista na hora do rush, especialmente numa avenida como a Santos Dumont, que tem apenas duas faixas, interrompe o fluxo dos veículos para além daquele quarteirão. "Não tem como mensurar, mas o comportamento egoísta compromete muito a fluidez e a segurança do trânsito", diz Carlos Henrique Pires, engenheiro de tráfego da Autarquia Municipal de Trânsito (AMC). Uma conversão proibida, além de bloquear o trânsito, por mais "rapidinha" que seja, pode provocar uma colisão do veículo que vem atrás e é pego de surpresa pela freada brusca. "O sujeito que causa o acidente não tem nem noção do prejuízo e do congestionamento que causou", diz Carlos.

Gentileza X Egoísmo
Falta gentileza e sobra egoísmo. Vladimir Almeida, 34, estaciona em plena Domingos Olímpio, com trânsito intenso, às 8 horas, para descarregar a entrega do frigorífico. Em frente ao estabelecimento, sete vagas estão desocupadas. "É que se paro ali, não consigo sair. Ninguém vai me deixar entrar na avenida", justifica. O raciocínio da senhora que fecha o cruzamento na rua Jaime Benévolo com Joaquim Magalhães é o mesmo. "Estou em cima da hora. Se deixo espaço, os carros não respeitam minha preferencial e na minha vez de seguir fico presa".
Para não ser sabotado, o motorista sabota antes. E todo mundo tem uma desculpa pronta. "Essa lógica individualista não é só do infrator, é a lógica que estamos vivendo hoje. Temos que ser primeiro lugar em tudo. A sociedade reforça a idéia de que, se você está se livrando, tudo bem", diz a psicóloga Gislene Macedo, que estudou o comportamento do motorista em sua tese de doutorado. Dentro do carro, disputando espaço com outros veículos e correndo contra o tempo, o individualismo se escancara, muitas vezes com agressividade.
Um cidadão "do bem", solícito e calmo, pode se descontrolar dirigindo. "Estudos apontam que a mecânica do carro vira uma extensão das nossas forças físicas. Você transpõe barreiras que a pé não conseguiria e isso dá uma sensação de poder. Mistura estresse com poder, já viu", diz Gislene. É certo que há vias supersaturadas, especialmente nos horários de pico, mas o trânsito nem se compara ao de grandes cidades como São Paulo. Por isso, a psicóloga estranha o nível de estresse e a percepção de caos que os usuários do trânsito sentem em Fortaleza.
A maioria dos deslocamentos não são feitos em carros particulares na cidade que tem baixo índice de motorização. A cada 100 pessoas 12,91 têm carro. "Não temos características para estar como estamos com tantos acidentes, multas e estresse, mas hábitos do trânsito daqui, coisas que não se vê em São Paulo, como as conversões proibidas, agravam muito o cenário. Tem alguma coisa difícil de quebrar no comportamento dos motoristas de Fortaleza", afirma Gislene.

http://www.amc.fortaleza.ce.gov.br/modules/news/article.php?storyid=3071